Iboga (Tabernanthe iboga)
Em estudos
preliminares com ratos, a substância alucinógena conhecida como
Ibogaína (extraída de arbusto encontrado no oeste africano) confirmou
suas propriedades anti-dependência do álcool. O mecanismo pelo
qual a substância age no corpo foi identificado, abrindo
novos caminhos para o desenvolvimento de drogas para combater o
mal.
Durante a pesquisa,
ratos e camundongos foram induzidos ao consumo de álcool em
doses diárias até habituarem-se à bebida. Os testes com Ibogaína
demonstraram uma queda efetiva no consumo da substância pelos
roedores, diretamente relacionado ao aumento da produção de
uma proteína pelo cérebro, o GDNF. A relação entre o GDNF e o
controle da dependência permitirá o desenvolvimento de
medicamentos para tratar o alcoolismo, sem os efeitos colaterais da
Ibogaína.
Mesmo com suas
propriedades terapêuticas reconhecidas, a Ibogaína não deve ser
estudada como base para o desenvolvimento de remédios - sua alta
toxicidade e características alucinógenas são os principais
motivos para que o mecanismo pelo qual ela funciona seja
utilizado pela indústria farmacêutica sobre diferentes formas.
Sobre esta
planta, vale a pena ler um trecho do artigo de Beatriz Caiuby Labate
(Antropóloga - Unicamp, Brasil):
As plantas
psicoativas têm sido utilizadas há 50 mil anos pela humanidade,
em diferentes culturas e épocas, sendo objeto de culto e reverência ou
de demonização. A paixão que despertam revela-se, em primeiro
lugar, pela própria maneira de nomeá-las. Alguns
pesquisadores têm criticado o termo científico alucinógeno, por sugerir uma percepção falsa e ilusória da realidade. Uma opção adotada tem sido enteógeno, originário do grego antigo, com o significado de "Deus dentro" ou "o que leva o divino para dentro de si". Outra, mais ligada à contracultura, é psicodélico, "aquilo que revela o espírito ou alma". Alguns preferem utilizar termos nativos, como é o caso de plantas professoras,
expressão característica do vegetalismo peruano, ou adotar
denominações que sublinhem as dimensões neurofarmacológicas
comuns às várias substâncias, como a proposta por Michael
Winkelman, plantas psicointegradoras, aquelas que "integram os hemisférios direito e esquerdo do cérebro".
As diversas
populações que fazem uso dessas substâncias consideram, em geral,
que elas são habitadas por um espírito, uma "mãe", um "dono" - com o
qual podemos nos comunicar e aprender. Elas seriam, portanto,
um espírito-planta. Um traço comum aos variados contextos é a
crença de que, por meio dessas substâncias, é possível
estabelecer contato com o mundo espiritual, com os seres
divinos, e transcender as fronteiras da morte.
Historicamente, o
uso de tais psicoativos tem sido associado ao reforço da identidade
étnica, à promoção da coesão social, à transmissão de valores
culturais, à produção artística, à morte simbólica do ego, ao
autoconhecimento, à resolução de conflitos sociais, à guerra, à
feitiçaria, à caça, ao poder político e cósmico, à
metamorfose em animais e à divinação, entre outros. Uma das
dimensões centrais das plantas de poder é a sua conexão estreita
com os sistemas de cura, seja através da figura do xamã, seja através
das religiões institucionalizadas. A cura propiciaria uma
conexão holística entre processos mentais, emocionais e
espirituais - mesmo porque, em alguns dos contextos onde estas
substâncias são consumidas, tais esferas são consideradas
inseparáveis.
A ciência
norte-americana dos anos 50 e 60 desenvolveu diversas pesquisas
e experimentações sobre as virtudes médicas e terapêuticas dos
psicoativos, sobretudo antes da proibição legal do LSD nos
EUA, em 1966. Entretanto, o tema permanece ainda pouco
estudado, além de fortemente estigmatizado. Os assim chamados
estados alterados de consciência não são provocados apenas por
substâncias químicas. Eles também podem ser produzidos por
estímulos auditivos, jejuns nutricionais, isolamento social e deprivação
sensorial, meditação, estados de sono, abstinência sexual,
comportamento motor intensivo, opiáceos endógenos e estados
mentais resultantes de alterações na neurofisiologia ou
química corporal.
Tabernanthe iboga
Trata-se de um
arbusto com uma raiz subterrânea que chega a atingir 1,50m de altura,
pertencente ao gênero Tabernanthe, composto por várias espécies.
A que mais tem interessado a medicina ocidental é a Tabernanthe iboga,
encontrada nos Camarões, Gabão, República Central Africana,
Congo, República Democrática do Congo, Angola e Guiné
Equatorial. Seu principal alcalóide é a ibogaína, extraída da
casca da raiz. Algumas espécies animais, entre as quais os
mandris e os javalis, alimentam-se das raízes da iboga para
conseguir efeitos entorpecentes. Imagina-se que os pigmeus descobriram
a eboka (iboga) observando o comportamento desses animais. Até
hoje, estas populações utilizam a iboga em seus ritos.
Em 1901, a ibogaína
foi isolada pela primeira vez. Há notícia de que ela teria
sido usada no Ocidente desde o início do século XX, no tratamento
de gripe, neurastenia, doenças infecciosas e relacionadas ao sono.
Em 1962, Howard Lotsof, um jovem dependente de heroína, acabou
descobrindo, por acaso, a iboga na África. Após uma viagem
astral de 36 horas, relatou que perdeu o desejo de consumir
heroína por completo. Em 1983, Lostsof relatou as propriedades
antiaditivas da ibogaína e em 1985 obteve quatro patentes nos
EUA para o tratamento de dependências de ópio, cocaína, anfetamina,
etanol e nicotina. Fundou o International Coalition for Addicts
Self Help e desenvolveu o método Endabuse, uma farmacoterapia
experimental que faz uso da ibogaíne HCl, a forma solúvel da
ibogaína. Através da administração de uma única dose, cujo
efeito dura dois dias, haveria uma atenuação severa dos
sintomas de abstinência e uma perda do desejo de consumir drogas por
um período mais ou menos longo de tempo.
Atualmente, a iboga é
utilizada por curandeiros tradicionais dos países da bacia do
Congo e na religião do Buiti na Guiné Equatorial, Camarões e,
sobretudo, no Gabão, onde membros importantes das hierarquias
políticas do país são adeptos do culto. Aproveita-se
principalmente a casca da raiz, mas também se atribuem
propriedades medicinais às folhas, à casca do tronco e à raiz.
No Gabão, a raiz e a casca da raiz são encontradas facilmente nas
farmácias tradicionais e nos mercados das principais cidades. A
iboga pode ser utilizada sozinha ou em combinação com outras
plantas - uma parte desse conhecimento permanece secreto.
Segundo depoimentos que colhi nos Camarões em 2001, ela é
empregada no tratamento da depressão, da picada de cobra, da impotência
masculina, da esterilidade feminina, da AIDS e também como
estimulante e afrodisíaco. De acordo com as crenças locais,
seria eficaz, ainda, sobre as doenças místicas, como é o caso
da possessão.
(...) A literatura
científica sobre o tema é controversa. Sabe-se que a ibogaína
produz perda do equilíbrio corporal, tremores, aumento da temperatura
corpórea, da pressão e da freqüência cardíaca. Estudos com ratos
e primatas demonstraram que a ibogaína em quantidade de 100
mg/kg é neurotóxica (a dose utilizada no tratamento de Lotsof é
normalmente de 25 mg/kg). Ela é diferente de outros
medicamentos, na medida em que é a única substância conhecida
que age diretamente sobre o suposto mecanismo da dependência
no corpo humano. Entretanto, não se conhece ao certo seu grau de
eficácia e não existe nenhum estudo científico que comprove
que a ibogaína cure a dependência química; há apenas
evidências anedóticas.
Os tratamentos com
ibogaína não são autorizados nos Estados Unidos, Reino Unido,
França ou Suíça. Mesmo assim, têm sido adotados clandestinamente.
No Panamá, a instituição liderada por Lotsof cobra 15 mil dólares;
na Itália, o custo é de 2.500 dólares, e, nos EUA, o
tratamento varia entre 500 e 2.500 dólares. Em Israel, a iboga
está sendo pesquisada para uso no tratamento da síndrome de
pós-guerra que afeta os soldados. De acordo com o médico
italiano Antonio Bianchi, a ibogaína age sobre uma enorme
quantidade de receptores neuronais. Sua característica fundamental é sua
ação sobre a NMDA (N-metil-D-aspartate). Esses receptores
estão presentes, sobretudo, em duas áreas: o hipocampo, que
controla a memória e as recordações, e a sensibilidade
proprioceptiva, parte responsável pela sensação que temos do
nosso corpo físico. Se esses receptores forem bloqueados, a pessoa
construirá uma imagem do "eu" que não está relacionada com o eu
físico, ou seja, sentir-se-á fora do corpo. Este seria o
mecanismo neurofisiológico da viagem astral, o ponto de
encontro entre as concepções religiosas e as científicas.
Nessas condições, o homem tende a construir aquilo que é
definido como uma bird-eye image, assumindo uma projeção de si
mesmo a partir de uma posição do auto - experiência também
recorrente nos relatos da ayahuasca.
Nenhum comentário:
Postar um comentário